Quarta-feira, 29 de Abril de 2009

 

As narrativas encaixadas
 
Memorial do Convento

 
 
Ao lado da história da construção do convento, com tudo o que grandioso e trágico representou, surge o fantástico, que permite a realização dos sonhos e as crenças num universo de magia.

 
 
 
Acção principal
 

*      A construção do convento, como pagamento de uma promessa do rei, que queria um herdeiro.
 
*      O sacrifício do povo que nele trabalhou.
 
 
 
O sonho de um rei megalómano e vaidoso – a miséria do povo, humilhado e explorado.

 
Acções secundárias
 

*      A história de amor que liga Baltasar e Blimunda.
 
*      A construção da passarola.
O sonho de um padre excêntrico – a grandeza do homem que supera as suas limitações e desafia os códigos morais e culturais da época.

 
 
As linhas da acção
 
era uma vez um rei… / era uma vez a gente…
 
*      Libertino, caprichoso, vaidoso, megalómano, querendo imitar a magnificência de Versalhes para ser lembrado como um rei poderoso e magnífico.
 
*      Herói atípico, descrito como deficiente, feio, rude, que humildemente sofre e se sacrifica para realizar o sonho do seu rei. Em MAFRA, os trabalhadores são «…mortos, assados, fundidos, roubados, arrastados…».
 
era uma vez um padre…
 
*      Culto, visionário, excêntrico, enfrenta intrigas e difamações da corte para construir uma máquina de voar. Desafia mesmo o poder persecutório do Santo Ofício, mas acaba por morrer louco.
 
era uma vez um soldado maneta… / era uma vez uma mulher que tinha poderes…
 
*      Apaixonados, entregues à grandiosa tarefa de construir a Passarola, descobrem os gestos de ternura, a cumplicidade e a grandeza da sua vontade: ele supera a sua deficiência física para construir um convento e uma máquina voadora, ela compreende a magia dos seus olhos, que vêem o interior das coisas e dos homens.
 


publicado por Isabel Marques às 12:35

 

A LINGUAGEM E O ESTILO
 

 
 
 
 
A escrita de Saramago lembra, em parte, o estilo engenhosodo Barroco pois os ornamentos retóricos têm a função de captar, por meio do deleite, a atenção do leitor.
 
Recursos de estilo
(descrições visualistas)
 
 
 
 
 
 
Recursos de estilo
*       adjectivação «...aqui vou blasfema, herética, temerária, amordaçada…» (53)
*       hipérbole «…triste morte, foi um abalo muito grande, como um terramoto profundo que lhe tivesse rachado os alicerces…» (235)
*       metáfora «O cântaro está à espera da fonte…» (13)
*       ironia «…o mal é dos corpos, que a alma, essa, é perfumada…» (28)
*       trocadilho «…o côncavo meu no teu convexo, no meu convexo o teu côncavo, é o mesmo que homem e mulher, mulher e homem…» (203)
*       a onomatopeia «…a bater a pedra, truca-truca, truca-truca…» (220)
*       hipálage «… Romeu que, descendo, colhe o debruçado beijo de Julieta…» (334)
*       jogos de palavras e conceitos «…Fala das mãos, Falo das obras, tão cedo nascem logo morrem, Fala das obras, Falo das mãos…» (167)
 
Originalidade
(sátira / intertextualidade)
 
 
 
*       a sátira, com recurso à ironia, à linguagem depreciativa e humorística, à subversão de citações bíblicas («Pater noster que non estis in coelis.», 159);
*       a ruptura com as regras de pontuação, introduzindo um peculiar discurso directo sem utilizar os sinais gráficos, ao abolir os dois pontos, os travessões e o ponto de interrogação e ao utilizar a maiúscula após uma vírgula;
*       a presença do narrador-autor com comentários, apartes e frases sentenciosas;
*       a intertextualidade frequente, sobretudo com Os Lusíadas («…foi como o sopro gigantesco de Adamastor, se Adamastor soprou, quando lhe dobravam o cabo…», 133);
*       a inclusão de um discurso argumentativo e reflexivo.
 
Sabedoria popular
(provérbios / expressões idiomáticas)
Provérbios originais:
 
*       «…o sol quando nasce, é para todos…»
*       «…a melhor lição é sempre o bom exemplo…»
*       «…uma mão lava a outra…»,
*       «…o hábito não faz o monge…»
*       «…uma desgraça nunca vem só…»
 
Provérbios adaptados:
 
*       «…e ainda a procissão vai na praça…»
*       «…dai a César o que é de Deus e a Deus o que é de César…»
*       «…fazendo o bem olhando a quem…»
*       «…mas as mulheres não se medem aos palmos…»
 
 
 



publicado por Isabel Marques às 12:33

 

 

Memorial do Convento

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

*      Resgatar do anonimato do povo anónimo e escravizado, o verdadeiro construtor do Convento de Mafra, homenageando a sua grandeza épica.

 

 


Ridicularização do sonho megalómano do rei, ao mostrá-lo infantilmente empenhado em construir uma réplica da Basílica de S. Pedro.

 

 

*      Denúncia de todas as formas de violência, intolerância e repressão que atentam contra a dignidade e a liberdade do ser humano.

 

 


Blimunda recolhe a vontade de Baltasar, quando este é queimado na fogueira inquisitorial.

 

 

*      A compreensão do destino do homem, da sua grandeza e dos seus limites, em busca da sua realização plena, através do trabalho, do sonho, do amor, da fé e do mistério…

 


A passarola voa e realiza o sonho do Padre Bartolomeu, contrariando o terror inquisitorial;

O amor de Baltasar e Blimunda supera a morte, quando esta recolhe a sua vontade;

Baltasar diviniza-se enquanto criador de uma máquina voadora e construtor de um convento;

Blimunda usa o seu poder mágico para poder voar.

 

 




publicado por Isabel Marques às 12:30

 

O ESTATUTO DO NARRADOR
 

 

 
 
 
 

Narrador heterodiegético
 
 
Focalização omnisciente
 
 
 
Ao assumir diferentes pontos de vista, muitas vezes contraditórios, o narrador torna-se uma voz polifónica, garantindo a modernidade da obra.
 
 
A focalização omnisciente implica uma vertente subjectiva e permite ao narrador seleccionar o que deve narrar.
 
 
O narrador garante uma contínua cumplicidade com o narratário e permite a implicação deste na narrativa:
 
«…que importância hão-de ter os sonhos que por trás das suas pálpebras se estão sonhando, a nós o que nos interessa é o trémulo pensamento que ainda se agita em D. Maria Ana…» (pág. 32)
 
«…porém, vindo nós de uma guerra onde vimos morrer tanta gente…» (pág. 37)
 
O narrador reflecte sobre o processo de escrita, desmistificando assim o seu papel, como se verifica nos comentários metatextuais:
 
«São comparações inventadas por quem escreve para quem andou na guerra, não as inventou Baltasar…» (pág. 110)
 
«Não é possível que Blimunda tenha pensado esta subtileza, e daí, quem sabe, nós não estamos dentro das pessoas, sabemos lá o que elas pensam…» (pág. 341)
 
O controlo da narrativa por parte do narrador é ainda verificável nos comentários valorativos ou depreciativos, nos juízos de valor e no tom moralístico que perpassa em:
 
·         provérbios ou profecias:
 
«…a pobre não emprestes, a rico não devas, a frade não prometas…» (pág. 76)
«…a história da aviação não acaba aqui.» (pág. 203)
 
·         advertências ao leitor:
 
«…isto se devendo ler com muita atenção para que não escape ao entendimento.» (pág. 276)
 
O tom irónico ou sarcástico permite parodiar o passado histórico e o humor põe em evidência a discordância do narrador perante os factos evocados, concedendo ao leitor o espaço de julgamento inteligente, porque confia na sua perspicácia:
 
«…está o Rossio cheio de povo, duas vezes em festa por ser domingo e haver auto-de-fé…» (pág. 50)
 
«…se este rei não se acautela acaba santo.» (pág. 284)
 
O discurso do narrador é também anti-épico, quando rebaixa heróis que a História glorifica e nos apresenta como heróis gente anónima em que se incluem personagens com defeitos físicos, como Baltasar, ou homens andrajosos, como os operários da construção do Convento de Mafra:
 
«…termos consentido que viesse à história quanto há de belfos e tartamudos, de coxos e prognatas, de zambros e epilépticos, de orelhudos e parvos…» (pág. 244)
 



publicado por Isabel Marques às 12:27
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